Na
cidade de Barbalha
O
mundo as portas abriu
Numa
casinha de palha
Lá
nasceu Maria Raquel
Que
faria muito chapéu
Na
“terra que mais trabalha”
Dezessete
o ano era
(Ainda
nos novecentos)
Maria
Raquel só quisera
Fugir
dos vis sofrimentos
E
aqui conto sua história
Para
ficar na memória
E
não se perder no tempo
Nasceu
no “Santa Tereza”
Sítio
barbalhense e bom
Mas
a terra da riqueza
Propagada
em alto som
Era
o santo Juazeiro
D’um
povo simples e ordeiro
De
fé e paz tinha o dom
A
menina se mudou
Com
a família todinha
Tudo
para traz deixou
Até
sua boa casinha
E
chegando em Juazeiro
A
família foi ligeiro
Fazer
uma visitinha:
Na
Rua do “pai” São José
Morava
o padre mais santo
Padim
Ciço rico em fé
Uma
alma boa, de encantos
Ele
deu consentimento
À
família foi dizendo:
“Procurem
logo bom canto!”
A
família andou e andou
Chegou
num certo lugar
O
pai boa terra encontrou
E
juntos foram morar
A
meninada crescia
Como
a cidade luzia
Todo
mundo a trabalhar
Maria
era inteligente
Mas
não podia estudar
A
necessidade urgente
Do
pobre, de trabalhar,
Levava
Maria Raquel
A
pedir a Deus do céu
Para
uma arte encontrar
Talvez
tenha sido assim
Que
a meninota Raquel
Encontrou
a arte enfim
De fazer belos chapéus
Com
palha de carnaúba
Trazidas
das “Timbaúbas”
Fazer
trança era seu céu
A
menina então fazia
Após
a palha cortada
Sempre
com toda maestria
Tranças
muito ordenadas
Numa
“forma” costurava
A
trança que enfim formava
Chapéu
de palha alinhada
Maria
Raquel cresceu forte
Fazendo
trança e chapéu
Tristezas
de toda sorte
A
vida abriu como um véu
Mas
buscou sobreviver
Sem
nada em vida temer
Pedindo
forças a Deus
Na
seca de trinta e dois
O
pai foi buscar serviço
Em
outros caminhos, pois
O
tempo era mortiço
A
mãe ficou com Maria
E
um menor que morria
De
lábio branco e castiço
Maria
Raquel decidiu
Com
Padim Ciço falar
Só
em chegar já sentiu
Uma
paz lhe atravessar
Passou
pela multidão
Entrando
no casarão
E
assim pôde então falar:
“Venho
pedir ao Sinhô
Pra
mode minha mãe ir
E
peço, por seu favor,
Pra
nois ir pro Buriti
A
fome devora tudo
Meu
irmãozinho tá mudo
De
comida a nois pedir...”
Depois
de três tentativas
O
Padim Ciço a olhou
Perguntou
com voz ativa,
Olhar
pacificador:
“Quer
que sua mãe morra, quer?
Não
tem fome quem tem fé!
Faça
uma prece co’ardor...”
Chamou
Beata Mocinha
Pediu
uns tões e vinténs
Entregou-os
às mãozinhas
No
meio de tantos alguéns
Maria
ficou tão contente
Que
esqueceu, de repente,
Que
a vida tem seus poréns
Mais
de três meses foi lá
Em
busca dos bons auxílios
Que
o santo disse que ia dar
Para
os seus sofridos filhos
A
seca passou e a vida
Ficou
menos dolorida
“O
trem voltou pros seus trilhos”
Sempre
foi muito teimosa
Desde
sempre corpulenta
Tinha
alma amistosa
Mas
também era briguenta
Numa
briga com o irmão
Deixou
parede no chão
Foi
uma briga violenta
E
Maria Raquel cresceu
Tentando
sobreviver
Trabalhou,
lutou, perdeu
Era
agora uma mulher
Sempre
bondosa, mas forte
Lidou
até com a morte,
De
sua mãe, sempre de pé
Os
filhos para cuidar
Fugir
da fome severa
Muito
ter que trabalhar
Virou
mulher tão austera
Nunca
foi fácil sua vida
Mas
sempre enfrentou sua lida
Ser
feliz era quimera?
Mas um dia sorriu faceira
Quando
um nobre cavalheiro
Avistou-a
tão trigueira
De
braços fortes, ligeiros,
Erguendo
um balde de água
Com
força de quem traz mágoas
No
corpo, olhos, cabelos
Nas
“Timbaúbas” morava
O
cavalheiro bonito
De
olhar que mais azulava
Tocava
o azul do infinito
Por
Maria Raquel brilhou
Ele
então a conquistou
O
amor não era só mito!
Maria
Raquel foi parteira,
Foi
artesã, mãe, avó
Foi
mulher trabalhadeira
Chegou
a ser bisavó
Dia de São Pedro fazia
Renovação
co’alegria
Era
uma festa só!
Maria
Raquel devolveu
Com
oitenta e tantos anos
A
vida que Deus lhe deu
E
foi morar n’outro plano
Quem
sabe foi fazer chapéu
Para
os santos lá do céu
Com
seus dedos tão humanos!
Cícero Émerson do Nascimento Cardoso
29.11.11
Sempre me emociono com esse texto. Obrigada por escrever sobre nossa mãezinha e me fazer lembrar o que a memória não deixa!
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