Conheço Federico García Lorca porque ele escreveu a obra em poesia que eu mais estimo na vida: Romanceiro cigano. Confesso que não conhecia a obra musical deste poeta e dramaturgo grandioso da Literatura Universal, também não conhecia a obra de Manuel de Falla e Isaac Albéniz. Foi até bom não conhecer tais obras para ter o privilégio de, através do concerto Anda, Jaleo!, conhecê-las da melhor e mais plena forma possível.
Como pude constatar, pela brilhante apresentação deste dia 19/09/14, o trio Edd Evangelista (voz), Erik Pronk (violão) e João Victor Figueirêdo (percussão), apresenta um repertório composto por dezesseis músicas que estão divididas em duas partes. Na primeira, temos: Danza de Molinero e Homenaje a Debussy (Manuel de Falla), Las três hojas, Los cuatro muleros, Los Reyes de la baraja, El café de Chinitas, Los mozos de Monléon e Servillanas del Siglo XVIII; na segunda, temos: Asturias - Leyenda (Isaac Albéniz) Las Morillas de Jaén, Romance de Don Boyso, Los peregrinitos, Nana de Sevilla, Zorongo gitano, La Tarara e, finalmente, a canção que dá título ao concerto: Anda, Jaleo!
Além de um repertório bem escolhido, foi possível perceber, da caracterização dos músicos à escolha pelo cenário (a igreja de São Vicente de Paulo que, com seu aspecto rústico, ampliou a atmosfera encantadora criada durante a apresentação), três músicos geniais capazes de, numa mais que evidente harmonia, dar o melhor de suas artes.
Sendo músicos de currículo notável, foi possível ouvir, e sentir, a beleza e perfeição com que as obras que compõem o concerto foram executadas. Edd Evangelista, tendo na percussão envolvente de João Victor Figueirêdo e no violão impecável de Erik Pronk seus complementos, fez ecoar sua voz mais no íntimo de quem o ouvia do que nas paredes da igreja que tinha o privilégio de recebê-lo com todo o seu talento. Uma tríade de talento incomensurável, sem dúvidas, estes exímios conhecedores da arte musical tornaram possível ao público sair um pouco do cotidiano da vida, do senso comum e abriu espaços para a beleza que a música erudita pode proporcionar a quem a busca em sua grandeza e profundidade.
Essa tríade encantará a quem não dispõe de conhecimento mais amplo em termos de teoria musical e não deixará de agradar a quem dispõe deste conhecimento, e dele se vale para fazer análises mais rigorosas. Ter comparecido a esse evento, para mim, foi um momento de imersão na singeleza da arte musical numa das mais sóbrias exibições de sua força e forma, e possibilitou-me vislumbrar como o erudito e o popular, à luz de García Lorca, e demais compositores que complementam o repertório, conseguem unir-se para dar vazão a elementos que retomam a tradição de músicas antigas do cancioneiro espanhol no que há de mais lírico, encantador e extraordinário.
Minha experiência pessoal com o concerto Anda, Jaleo! foi, definitivamente, de encantamento e admiração. Estive, durante toda a apresentação, fora de minhas tramas existenciais e imerso no espaço onírico que esses músicos me proporcionaram. Pela reação do público, que aplaudiu com euforia e comoção, a exibição desta noite, parece-me que eu não fui o único a ficar encantado com o que esses três rapazes realizaram. Vi-me, em todo tempo, enredado pela atmosfera em que García Lorca atira suas personagens e suas vozes líricas. Para ficar apenas com alguns exemplos, Zorongo gitano me fez recordar os poemas do Romanceiro cigano - livro a que devoto minha mais fidedigna estima -, Romance de Don Boyso e Sevillanas del Siglo XVIII me transportaram para a terra que García Lorca tanto enalteceu em suas obras e cuja devoção, de certa forma, o conduziu para uma morte inadmissível. Enfim, ao escutar a última canção apresentada - Anda, Jaleo! - fiquei alegre e triste: alegre por sentir-me privilegiado por ter visto algo tão peculiar, porém triste porque esta foi a última canção apresentada quando, em verdade, eu ficaria horas e horas a escutar o que esses rapazes prepararam com tanta dedicação.
Edd Evangelista (integrante do Grupo Camerista Iamaká e professor de técnica vocal), Erik Pronk (integrante do Grupo Camerista Iamaká e Camerata Filipeia) e João Victor Figueirêdo (Grupo CAMENA de Música Barroca) são músicos profissionais e que têm larga experiência com estudo de música. A quem preza por qualidade, e precisa de arte para sentir-se menos infeliz neste mundo problemático, eis uma excelente opção. Espero que outros concertos sejam idealizados e realizados por essa tríade de músicos talentosos - eu, certamente, farei de tudo para prestigiá-los com minha presença e meus aplausos.
Texto de: Émerson Cardoso
19/09/14
Émerson, muito obrigado pelas suas palavras. Sinto-me muito abraçado por elas e quero dizer que é sempre gratificante compartilhar a nossa arte - que também é literatura - , com todos aqueles que assim como você, sabem o seu valor e beleza interior. Abraço grande e Vamos à Luta, vamos ao Jaleo!
ResponderExcluirObrigado pela atenção - vocês merecem todo elogio!!! Abraço!!!
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