sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

ROMANTISMO NO BRASIL (PARTE III): TRECHO DE "O NAVIO NEGREIRO", DE CASTRO ALVES


Castro Alves (1847 - 1871) nasceu na Bahia e foi um poeta que fez uso de forte sugestão visual e auditiva, recorrentes antíteses e hipérboles ao tratar de temas como: a exaltação da natureza pátria, a alusão constante à figura feminina não idealizada e sim envolvida por uma atmosfera de erotismo e sensualidade. Dentre suas obras podemos destacar: "Espumas flutuantes" (1847), "A cachoeira de Paulo Afonso" (1876) e "Os Escravos" (1883). Seu conhecido poema "O navio negreiro" mostra o sofrimento dos negros ao serem transportados da África para o Brasil em sujos navios, nos quais chegavam a permanecer cerca de três meses. Devido às condições precárias a que eram submetidos, muitos não resistiam e morriam no caminho.

Este poema foi declamado por Castro Alves, pela primeira vez, no dia 07 de setembro de 1868, numa comemoração da Independência do Brasil. Ele discorre sobre a mais vergonhosa mancha da história do Brasil: a escravatura. Castro Alves, dentre outros temas, dedicou-se com veemência às causas humanas e sociais do seu tempo, entre elas o abolicionismo. 



I
'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço
Brinca o luar - dourada borboleta - 
E as vagas após eles correm... cansam...
Como turba de infantes inquieta.
'Stamos em pleno mar... Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro....
O mar em troca acende as ardentias,
- Constelações do líquido tesouro...

[...]

IV
 Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho, 
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras, moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra, irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que de martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra
Tão puro sobre o mar,
Diz que do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual num sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...

  

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