quarta-feira, 21 de setembro de 2022

CARTA PARA QUEM ESCREVE UMA TESE DE DOUTORADO


Caros irmãos e irmãs, 

Antes de iniciarmos a escrita da tese, que nos deixa em tensão constante, passamos por um processo seletivo excludente e massacrante, concorda? Quando saiu o resultado, devo dizer, a alegria foi sem tamanho. A sensação de vitória não nos cabia no peito, lembra? 

Depois, vêm as disciplinas a cumprir, com seus respectivos trabalhos de conclusão. Em seguida, temos que retomar nossos projetos e reorganizá-los para iniciar o trabalho de pesquisa. Tudo em atendimento a burocracias e a cumprimento de prazos. Faz parte do métier, sei disso, mas não é tão simples quanto parece. 

Não sei como aconteceu com vocês, mas, no meu caso, eu estudei em João Pessoa-PB, cidade muito distante da minha, de modo que ir para as aulas, semanalmente, foi uma experiência entre alegre e angustiante: 1) alegre porque ir para as aulas era a certeza de que eu havia entrado no Programa de Pós-Graduação tão desejado e a oportunidade de estudar com professores e professoras, sem exceção, incríveis; 2) angustiante porque voltar para casa era ter que ir da rodoviária, depois de quase nove horas de viagem, para a escola em que trabalho. Gosto muito de ser professor, mas na ocasião, quando eu esperava o afastamento do Estado (que me veio seis meses depois e, por questões burocráticas, durou apenas um ano), a sala de aula me consumia.

Agora, que estou na escrita da tese, penso muito no seguinte: que tal transformar esse processo que pode ser angustiante em algo suportável? 

Para começar, devo dizer que escrever uma tese é um processo extremamente solitário. Ele exige solidão, sem dúvidas, porque só se desenvolve quando se tem, minimamente, um espaço adequado para a leitura e a escrita, quando se tem ambiente silencioso e tranquilo com a menor quantidade possível de interferências etc. Que tarefa difícil encontrar esse espaço para muitos de nós!

Quando consigo esse espaço, coloco cânticos gregorianos, sons da natureza ou de harpas. Os livros de que preciso coloco-os todos muito próximos de mim. Escrevo seguindo um roteiro mental diariamente construído. Como faço mapeamento das obras literárias que analiso, também fichamentos das obras teórico-críticas lidas ao longo da pesquisa, isso me ajuda significativamente. Devo dizer, todavia, que não deixa de ser desafiador cumprir esse ritual!

Nesse processo que exige organização e momentos solitários, Deus sabe, corremos o risco de vivenciar dores físicas e psíquicas. Psíquicas, sobretudo, pois sentimos pressões de todos os lados. Os familiares raramente consideram nossa atividade como um trabalho relevante. Os amigos raramente conseguem a empatia que nos representa acolhida para lidar com a necessidade de distanciamento, por vezes, tão sofrida. Quem tem relacionamentos afetivos pode sofrer com cobranças de atenção quando, em verdade, o que queremos é empatia e apoio. Os ambientes de trabalho (caso estejamos vinculados a algum ambiente de trabalho) não têm a verdadeira dimensão do sacrifício que é estudar, produzir uma tese e sobreviver às exigências inerentes às atividades a serem realizadas. Os programas (não são todos) criam seminários acadêmicos e relatórios a serem entregues periodicamente com o objetivo de, por vezes, burocratizar o que já é burocratizante ao extremo. Faz parte do métier, claro, mas ainda é desafiador!

Nesse contexto todo, ainda existe a relação com o orientador, que pode ser maravilhosa ou desalentadora (eu tive a sorte de ter o melhor orientador do mundo, tendo em vista que ele tanto orienta trabalhos acadêmicos com dedicação e vasto conhecimento, quanto ajuda na compreensão de conteúdos que podem ser complexos, sempre com respeito e gentileza). Há casos, porém, em que as pessoas não têm essa mesma sorte. O sofrimento, quando isso acontece, pode ser triplicado. Torço para que vocês estejam bem nesse quesito! 

Quanto ao processo de escrita da tese propriamente dito, invade-nos, frequentemente, o MEDO. Temos medo de não dar conta do trabalho, de não cumprir os prazos, de não conseguir realizar um trabalho digno da leitura do orientador (no meu caso, como meu orientador é, realmente, maravilhoso, eu fico com o receio de decepcioná-lo), de falhar, de não alcançar os objetivos propostos no projeto etc. São muitos os medos - e isso amplia nossa angústia e ansiedade. Muitos de nós (eu que o diga) precisamos de psiquiatras e psicólogos para sobreviver a esse período. Em nosso caso, principalmente, somos sobreviventes de uma pandemia e estamos em contexto de desvalorização completa das pesquisas científicas em nosso país. A coisa não anda das mais tranquilas!  

Assim, entre angústias e medos, por vezes, ficamos paralisados. Então, não vamos deixar que isso aconteça. Vamos organizar nossos horários de escrita de modo a ter, também, um momento de distanciamento. Lazer, atividade física e distrações podem nos ajudar. Não vamos tomar café, por Deus, porque ele pode aumentar nossa ansiedade (se bem que algumas pessoas precisam do café para se manterem acordadas). Eu, se tomar café, não escrevo mais nada.

Além disso, vamos usar protetor solar para ficarmos diante do computador. Tive problemas de vermelhidão na pele e o protetor me ajudou. Seria interessante usarmos lubrificantes oculares para amenizarmos o ressecamento dos olhos. Vamos tomar muita água, viu? Também chás e sucos. Devemos acalmar a cabeça com músicas agradáveis. Assistir a filmes leves também pode ser uma boa ideia. Eu gosto de comédias. Vamos nos levantar, de vez em quando, e fazer alongamentos? Isso minimizará nossos problemas de circulação. 

Nesse momento em que o tempo corre indiferente ao nosso desespero, vamos acreditar em dias melhores e criar o hábito de escrever sem desanimar. Pausas para distanciamento, sim, mas dedicação também, pois escrever é criar um hábito, como tudo na vida, e exige algum sacrifício. Criado o hábito, o sofrimento tende a amenizar, porque o hábito dá a sensação de dever cumprido.

Depois, o que mais queremos é nos superar, construir um espaço de aprendizagens e ser capazes de olhar para esse momento de "sofrimento" e dizer: foi um tempo difícil, sim, mas vencemos. Vencemos!

Pode parecer clichê, tudo o que escrevi, porém: vai passar essa fase mais difícil, viu? Em breve, conseguiremos aquilo a que tanto nos dedicamos. E todo esse processo doloroso terá valido a pena!

Muita força, coragem e dedicação! Estamos na luta por dias melhores! Estudar nesse país é resistência, então resistamos! 

Atenciosamente, 

Émerson Cardoso






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