segunda-feira, 31 de julho de 2023

CRÔNICA: CARTA PARA MIM MESMO EM PREPARAÇÃO PARA O PERÍODO EM QUE MAIS FICO DEPRESSIVO


Entre agosto e setembro, quando a temperatura sobe e o mundo torna-se insustentável para mim, eu tenho tendência a ficar depressivo. Deslocado que sou no mundo, sinto que a depressão faz parte de minha jornada e, sem querer apagá-la de mim, porque já a aceito em meu processo de existir, escrevo com um objetivo muito definido: quero atravessar esse meu deserto com algum preparo.

Será que minha angústia vem do fato de que as férias acabam e eu tenho que voltar a trabalhar? Não, não tem a ver com isso, porque apenas em 2023 eu tive, de fato, férias em toda a minha vida. Também não considero que sala de aula seja espaço angustiante a ponto de me causar depressão. Meus conflitos nunca estiveram vinculados à sala de aula, especificamente, porque a escola dói é no que não é estudante em busca de algum futuro. A escola dói, em verdade, é na inautenticidade de outros componentes que deveriam ser união e força e não o são. 

Será que minha angústia vem do aparente conflito interno que demonstro por ter uma mente que só está pacificada, no momento, porque mergulhada em oceano de Escitalopran e de Trazodona? Não, eu também estou melhor porque há tempos faço análise com um psicanalista lacaniano e isso tem me dado melhores dimensões sobre minha estrutura psíquica. 

Será que minha angústia vem de ser exigente com os outros? Não, não mesmo, porque se faço exigências é em relação a mim, que me percebo falho demais e vivo de autocobranças. Culpa, a propósito, tem sido um desafio. Estou na luta para me livrar dessa arrebatadora de vidas. A culpa é uma destruidora voraz de vidas. 

Será que minha angústia vem do passado? Traumas? Família disfuncional? Infância infeliz? Sobreviver, devo dizer, foi o maior dos atos nessa minha existência capaz de compreensões apesar do endurecimento das relações. Também a análise tem me dado novas percepções dessa vida que é caos, no entanto merece alguns esforços de continuidade. 

Será que minha angústia vem de... 

Chega! 

Não importa saber de onde ela vem. Importa saber apenas como existir apesar do que ela pode no devorar da carne. Importa, além disso, saber das esperanças motivadoras sem esquecer das fragilidades e das crueldades das relações. Tenho medo de altura, mas dificilmente não me inclinaria ao desafio de subir uma montanha. 

Minha angústia, eu estou aberto a conversar e torná-la parte de um todo que sou sem, contudo, percebê-la infame quando vem em enxurrada. 

Depressão, não me faça deitar em berço esplêndido e esperar que gritem às margens plácidas quando eu posso emitir meu próprio grito. 

Acolho, portanto, esse momento que me virá sem revolta, mas não com aceitação passiva, e quero estar pronto para seguir meu andar sem medo, sem amarras e sem cansaços aprisionadores. Em breve, quando passar essa nuvem de poeira, vamos prosseguir com novas motivações. Eu estou aberto às possibilidades de viver, mesmo que em alguns momentos eu não consiga encontrar no horizonte, senão, um constante ocaso. 

Émerson Cardoso
31/07/2023



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