sexta-feira, 21 de novembro de 2014

UMA BREVE EXPLANAÇÃO SOBRE "WESTERN"


CARDOSO, Cícero Émerson do Nascimento. Uma breve explanação sobre Western. Revista Sétima de Cinema, n. 19, p. 10 - 13, out. de 2014. 

Segundo Vugman (2006)[1], o Western é “considerado o gênero cinematográfico norte-americano por excelência”. De fato, o cinema norte-americano produziu para o mundo obras grandiosas deste gênero que alcançou mais do que o mero status de produto mercadológico, tornou-se um mito.
“O grande roubo do trem” (1903), de Edwin Porter, é considerado o pioneiro do Western e já apresenta algumas características que seriam determinantes para o gênero. Diretores como David W. Griffith, Thomas H. Ince, William S. Hart, John Ford, James Cruze, Tom Mix, dentre outros, deram suas contribuições para a construção de obras cinematográficas que foram, com a “evolução” do gênero, aperfeiçoadas tanto na qualidade técnica, quanto nas constantes inovações de estilos e temas empreendidas por estes.
Um dos temas recorrentes nas obras de Griffith e Ince – a oposição simbólica do bem contra o mal representada sempre pela ligação do herói com o sagrado e dos vilões com o profano – tornou-se uma das principais características do Western. Seguem-se a estas características: a reinvenção do Velho Oeste fundindo diferentes épocas e regiões dos Estados Unidos em um mesmo espaço peculiar e submetido a uma mítica atemporalidade, o realismo dos cenários, as movimentadas cenas em que o herói – sempre com seu estimado cavalo – envolve-se em perseguições ou enfrentamentos que exigem dele coragem e agilidade, a figura da mulher pura e singela capaz de redimir o herói de uma vida de violência, o saloon como palco profícuo para os vilões, as paisagens desérticas e áridas que reforçavam a austeridade da vida das personagens, a recorrente indumentária – roupa com acessórios produzidos em couro, esporas nos sapatos, chapéu e lenço no pescoço – que caracterizava o herói, dentre outras.
Para além desta discussão inicial de cunho mais teórico, considero pertinente dizer que o primeiro filme de Western que eu assisti foi “O homem que matou o facínora” (1962), de John Ford. Este filme me causou forte impacto pela qualidade do enredo, abordagem de certos temas e caracterização das personagens.
Um dos muitos filmes em que John Ford fez parceria com John Wayne, “O homem que matou o facínora” é uma adaptação de um conto escrito por Dorothy M. Johnson e discorre sobre um senador que volta à cidade de Shinbone, para o funeral de um velho amigo. O senador conversa com um jornalista explicando-se sobre o porquê de estar naquele funeral e, a partir disso, a história, como um fluxo, começa a ser relatada.
O senador trata-se de Ransom Stoddard (James Stewart) – advogado idealista – e o morto trata-se de Tom Doniphon (John Wayne) – um pistoleiro. Embora amigos, na juventude eles envolveram-se num conflito amoroso porque ambos se apaixonaram pela mesma mulher: Hallie (Vera Miles).
Enquanto o triângulo amoroso se estabelecia, a cidade sofria as ameaças do facínora Liberty Valance (Lee Marvin), vilão que só temia Doniphon e que espancara e roubara Stoddart, a quem reencontrou e provocou com veemência.
Quando Stoddard se vê de todo acossado por Liberty Valance, este decide desafiar o vilão e propõe um duelo, embora não tivesse habilidade no manejo de armas. Durante o duelo, Stoddard, que seria presa fácil para o facínora, consegue sair vencedor. Acontece que ele ganhou a fama, porém quem de fato havia assassinado Liberty Valance fora Doniphon.
Um filme de fluxos de consciência de uma personagem inserida num enredo que se desenvolve entre flashbacks, “O homem que matou o facínora” tende a exprimir com ironia e inteligência aspectos políticos e sociais que surgem no irremediável. Stoddard revive, no retorno à terra de sua juventude, lembranças por vezes amargas, embora saudosistas e repletas de um sentimento de excessiva gratidão. 
Uma das personagens que mais me chamam atenção, e que protagoniza uma das imagens mais comoventes de companheirismo e amizade no cinema, é a personagem Pompey (Woody Strode). Pompey, que durante toda a trama mostra-se um amigo fiel de Doniphon, está ao lado do caixão, sem necessariamente estar aprisionado pelos grilhões da mera subserviência, porque a ocasião já não o incitava a isto, velando o amigo. Por algum motivo que ainda não sei explicar, sempre que vejo menções a este filme, me vem à memória exatamente esta personagem que, do meu ponto de vista, é uma das mais bem delineadas desta obra.
Enfim, tanto se poderia dizer a respeito deste filme dirigido por um dos maiores nomes do Western, mas voltando a tratar do gênero Western, o que parece pertinente dizer, para finalizar esta breve explanação, é que este não parece ter arrefecido, pois, como se pode constatar, inúmeras produções atuais recorrem aos elementos que ele apresentou ao mundo e vários dos seus filmes, como “O homem que matou o facínora”, por exemplo, são mais que atuais e merecem ser vistos e revistos por serem de uma qualidade técnica irrefutável e por apresentarem personagens marcantes que compõem o imaginário que o Western construiu.  
Afinal de contas, parafraseando a fala de uma das personagens de “O homem que matou o facínora”: isto é o Western, senhores e senhoras, um mito, e que deve ser publicado.  




[1] VUGMAN, Fernando Simão. Western. In: MASCARELLLO, Fernando. História do cinema mundial. 7. ed. Campinas, SP: Papirus, 2006. (Coleção Campo Imagético).

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