ENTREVISTA
Eu
decidi realizar uma entrevista com uma pessoa específica para postar aqui no
Blog, mas, depois de muitas reflexões, decidi que faria algo diferente: escolhi
duas perguntas e pedi que alguns AMIGOS as respondessem. As duas perguntas
consistem no seguinte:
1
– O SÉCULO XXI É CONSIDERADO O SÉCULO DAS FRAGMENTAÇÕES. DO SEU PONTO DE VISTA,
O QUE É A VIDA ANTE AS FRAGMENTAÇÕES DESSE SÉCULO?
2
– A HUMANIDADE, DIANTE DA RÁPIDA VEICULAÇÃO DE INFORMAÇÕES QUE O MUNDO INFORMATIZADO
DISPONIBILIZA, PARECE BUSCAR NOVOS HORIZONTES QUE DEEM BASE PARA A CONSTRUÇÃO
DE UM SENTIDO (OU SENTIDOS?) PARA ALCANÇAR O DOMÍNIO DO SABER EM SUAS MAIS
AMPLAS ACEPÇÕES. DO SEU PONTO DE VISTA, COMO A LITERATURA PODE SER PENSADA
NESTA PERSPECTIVA? QUAL A SUA OBRA LITERÁRIA PREFERIDA?
JARDS
NOBRE
1 - É bastante antiga a consciência de que a
vida é breve. Monges medievais tinham o hábito de, ao passarem uns pelos
outros, dizer CARPE DIEM! MEMENTO MORI!, "Aproveita o dia! Lembra-te de
(que vais) morrer!" e talvez essa ideia da efemeridade da vida nunca
esteve tão forte quanto hoje, em que tudo tomou um ritmo acelerado, devido ao
desenvolvimento tecnológico. Para as gerações atuais, tudo é efêmero e banal: a
fotografia, a música, a fama, a possibilidade de percorrer o mundo... Do meu
ponto de vista, as pessoas têm procurado aproveitar mais a vida ante essa
consciência de que tudo se vai. Entretanto, na ânsia de fazer tudo de uma vez,
tudo é vivido de forma fragmentada, por vezes incompleta, o que traz um grande
vazio e a sensação de que nada vale a pena.
2 - A literatura, por exigir que se dê um tempo
no ritmo acelerado em que a vida flui para se mergulhar na leitura, em geral,
solitária, é, de todas as artes, a que vai contra a fugacidade das coisas. A
apreciação de uma exposição de telas ou esculturas, de um espetáculo musical,
de uma peça de teatro ou de um filme ou a audição de uma música se dá em
intervalos de tempo muito breves se compararmos com a leitura de um livro como
os romances russos ou as grandes sagas que viraram febre entre os leitores jovens
de hoje. Assim, vejo a literatura como uma forma fundamental de fazer o homem
parar refletir sobre a vida e apreciar a beleza das coisas. Minhas obras
literárias preferidas me mostram que não se deve adiar a concretização de
sonhos ou expressão de sentimentos sob o risco de, no futuro, não termos mais a
oportunidade de fazê-lo.
ANA
LUIZA CRISPIM
1 - A vida, acredito, ao passo que se
enriqueça, a cada dia, de possibilidades de interação com o outro, com modos
diversificados de ser encarada, também pode se mostrar de difícil
interpretação, de controle e ordem, o que gera insegurança e incertezas quanto
ao que espera que façamos dela.
2 - A literatura, como qualquer forma de
expressão artística, inevitavelmente, não pode ser dissociada da existência
humana, de discursar sobre ela. A partir do momento que se trata de algo
produzido por alguém (que reflete sobre a vida) para outro alguém (que também
reflete sobre tal),ainda que não da mesma maneira, é justamente o meio pelo
qual as pessoas dialogam acerca do que sentem ou veem e, muitas vezes, se
encontram. A arte, de fato, é este meio de interação com o outro no que se
refere a questões subjetivas, pois só ela detém a linguagem própria para
fazê-lo. Diante disso, ao me ocupar da leitura de determinada obra, o guardador
de rebanhos de Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa), por exemplo, vou
construindo significações em conjunto com as que me são apresentadas pelo
autor, mediante a nossa interação. Do ponto de vista que a atualidade por ser
flexível quanto às múltiplas informações, provenientes de inúmeros lugares, e o
possível desnorteamento que possa surgir mediante a isto, não é prejudicial, uma
vez que, em meio à diversidade, as pessoas findam se achando, interagindo com
quem lhes toca na alma.
JONAS JANDSON
1 e 2 - A arte de classificar
tudo é uma característica inerente ao ser humano, vejamos: aquele que não crê,
descrê; O oposto de branco é preto (e as outras cores também não são
diferentes?); Tal classificação não se faz ausente quando diante de datas,
sejam elas décadas, milênios ou, neste caso, o século contemporâneo. E,
curiosamente, a primeira recordação que tive ao ler a assertiva que precede a
primeira pergunta foi justamente do período ultrarromântico, quando a depressão
fora considerada o mal a ser combatido e, inclusive, ganhar a alcunha de
"mal do século".
Talvez quem me leia agora não tenha conseguido ainda
compreender aonde quero chegar, mas o que tento ressaltar é que os jovens que
começaram, naquela época, a ler romances como "o sofrimento do jovem
Werther", de Goethe, por exemplo, aderiram a uma onda de suicídio por
conta, talvez, de uma interpretação errônea daquilo que o autor quis realmente
transmitir. O fato é que a sucessão de mortes pós-leitura Goethiana realçou o
poder que a literatura exerce na sociedade, atuando, muitas vezes, como o leme
que guia os hábitos, costumes e formas de pensar de alguns indivíduos nela
inseridos.
Retomando, portanto, a ideia do "século da
fragmentação" e pegando como base meu argumento anterior de que o mundo
das letras pode sim direcionar o rumo de uma sociedade, acrescento uma nova
ideia baseado no pressuposto de que não existem sinônimos perfeitos. Sendo
assim, permito-me trocar o termo "fragmento" pelo sinônimo
imperfeito: romper.
Logo, a literatura moderna deve romper os padrões
aceitáveis, sejam eles formais ou éticos, e seguir um rumo contrário ao
politicamente correto, configurando-se como uma alternativa para o
estabelecimento da diferença como direito subjetivo e uma característica da própria
natureza humana, não uma anomalia. E, corroborando com as linhas anteriores,
meu livro preferido é 1984, de George Orwell, o qual traz como protagonista
Winston Smith, uma mente singular em meio a um sistema de governo totalitário
que oprime e força sua população a pensar como o seu líder de estado bem
entender, ao ponto de afirmar que 2+2=5 e, ainda assim, nem sequer ser
contestado (qualquer semelhança com a realidade NÃO é mera coincidência).
Por fim, concluo minhas respostas (creio que contemplei
ambas as perguntas em um texto só) explicitando meu parecer sobre a existência
"Sapien" em meio ao século atual, bem como sua supracitada
classificação, através de pequenas reflexões: as rochas se fragmentam diante da
erosão e, ao completar seu ciclo natural, mostram suas imperfeições;
imperfeitos são também os sinônimos, veja só os verbos fragmentar e romper que
ora cabem no mesmo contexto, em outros já não mais; um dia alguém teve sua
bolsa amniótica rompida. O resultado foi a vida! Algumas pessoas tentarão, ao
finalizar a leitura deste texto, entender qual foi minha meta. Outros,
simplesmente, entenderão minha meta-fora.
EDIVANIA
F. DA SILVA
1 – A vida é um mosaico cujo nosso
objetivo é juntar as peças para formar o desenho completo. Isso representa a nossa
busca pela felicidade, juntar as peças. Cada vez que uma peça fica mal
colocada, fora do lugar prejudicando a formação perfeita do desenho nos
sentimos infelizes. Então vivemos nessa eterna busca pra fazer da nossa vida o
desenho perfeito.
2 – Com a rápida veiculação das
informações e com tudo se tornando, cada vez mais descartável, tendemos a criar
relações fugazes, sem alicerces, isso vai nos tornando frágeis diante da vida,
diante dos outros e, principalmente, diante de nós mesmos. A literatura pode
ser um excelente meio de produção de sentido para uma vida pautada em relações
fugazes, pois ela nos ajuda a refletir, a sentir e a transformar a nós mesmos e
ao outro. A prova disso é que nunca mais fui a mesma depois dos livros que li.
Citar aqui a minha obra preferida é difícil porque são muitas, mas cada uma
delas trouxe a minha vida mais um pouco de sentido. Posso citar “A hora da
estrela”, “O guardador de rebanhos”, e até “O pequeno príncipe”. A literatura
foi o cimento da construção do que sou hoje...
RENAN SANTOS
1 – A vida para mim é a maior de todas as esfinges e a mais sedutora das interrogações. Que cisma horripilante, audacioso e fascinante esse de vir à tona depois de poucos meses como um feto disforme numa realidade marcada por complexidades gigantescas. Nascemos sem pedir, sem saber, sem nos dar conta conscientemente de que fomos lançados ao universo. Não escolhemos a família que nos trouxe à baila, nem sequer nosso nome elegemos. Somos raça e personalidade, pensamento e emoção, palavra e atitude, afeto e fúria, certeza e instabilidade, sentido e nada, criatura e criador, vitória e fracasso. A vida é uma não-escolha tatuada por escolhas absurdamente viáveis de um lado e dificílimas de outro. Não escolhemos nascer, embora a decisão se continuaremos a viver ou não caiba a nós, por vezes exclusivamente. Porém escolheríamos conquistar o coração do ser amado e tão distante; acertar a meia dúzia lotérica do milionário prêmio; encontrar a fórmula mágica para a juventude e a saúde infindas, ah sim! mas quantas impossibilidades... Por essas e infinitas outras razões, que fizeram tantos filósofos-escritores-pensadores-sonhadores perderem a cabeça para sustentarmos um pouco a nossa, é que direi até meu último dia que a vida é uma esfinge, porque mistério. Sim, para mim é isto: não tenho crenças sólidas, não acredito inteiramente em outras dimensões, então eu penso que viemos do mistério, do insondável, do arrebatador – e, com alguma sorte, para ele voltaremos: com nossas interrogações ampliadas ou amparadas em respostas-fé que talvez criamos para nos enganar a nós ou tomamos emprestado para não morrermos sufocados em nosso próprio destino do não saber. No entanto, como não sou pessimista demais, também concordo com Machado de Assis e sua frase final no leito de morte, de uma simplicidade estupendamente bela e reticente: “A VIDA É BOA!”, teria dito, antes do suspiro fatal, o “Bruxo de Cosme Velho”, à sua moda. E estou com o “zombeteiro”: embora fragmentado, confuso e ininteligível, estar vivo é melhor do que se nem tivéssemos nascido. Gosto dessa sensação errante que a vida proporciona. Quero acreditar que o acaso não existe. Que não somos apenas sombra. Que, como afirma Lya Luft, quando tudo parecer destruído na triste vida que nos restar, haverá, como “descanso de tela no eternamente ligado computador de cada um”, este letreiro de jubilosa esperança: “Escute a canção da vida”. Porque Vida é para ser sentida, sorvida, desafiada. Vida é incerteza e contradição, que, de mãos dadas com sua irmã leal, a Morte, nos traz concretamente a este mundo insano e dele nos tirará. Por isso somos títeres e maestros nesse concerto enigmático, onde o Mistério nos escreve; o Sofrimento nos dirige; o Ódio ensaia conosco e o Amor torce por nós...
RENAN SANTOS
1 – A vida para mim é a maior de todas as esfinges e a mais sedutora das interrogações. Que cisma horripilante, audacioso e fascinante esse de vir à tona depois de poucos meses como um feto disforme numa realidade marcada por complexidades gigantescas. Nascemos sem pedir, sem saber, sem nos dar conta conscientemente de que fomos lançados ao universo. Não escolhemos a família que nos trouxe à baila, nem sequer nosso nome elegemos. Somos raça e personalidade, pensamento e emoção, palavra e atitude, afeto e fúria, certeza e instabilidade, sentido e nada, criatura e criador, vitória e fracasso. A vida é uma não-escolha tatuada por escolhas absurdamente viáveis de um lado e dificílimas de outro. Não escolhemos nascer, embora a decisão se continuaremos a viver ou não caiba a nós, por vezes exclusivamente. Porém escolheríamos conquistar o coração do ser amado e tão distante; acertar a meia dúzia lotérica do milionário prêmio; encontrar a fórmula mágica para a juventude e a saúde infindas, ah sim! mas quantas impossibilidades... Por essas e infinitas outras razões, que fizeram tantos filósofos-escritores-pensadores-sonhadores perderem a cabeça para sustentarmos um pouco a nossa, é que direi até meu último dia que a vida é uma esfinge, porque mistério. Sim, para mim é isto: não tenho crenças sólidas, não acredito inteiramente em outras dimensões, então eu penso que viemos do mistério, do insondável, do arrebatador – e, com alguma sorte, para ele voltaremos: com nossas interrogações ampliadas ou amparadas em respostas-fé que talvez criamos para nos enganar a nós ou tomamos emprestado para não morrermos sufocados em nosso próprio destino do não saber. No entanto, como não sou pessimista demais, também concordo com Machado de Assis e sua frase final no leito de morte, de uma simplicidade estupendamente bela e reticente: “A VIDA É BOA!”, teria dito, antes do suspiro fatal, o “Bruxo de Cosme Velho”, à sua moda. E estou com o “zombeteiro”: embora fragmentado, confuso e ininteligível, estar vivo é melhor do que se nem tivéssemos nascido. Gosto dessa sensação errante que a vida proporciona. Quero acreditar que o acaso não existe. Que não somos apenas sombra. Que, como afirma Lya Luft, quando tudo parecer destruído na triste vida que nos restar, haverá, como “descanso de tela no eternamente ligado computador de cada um”, este letreiro de jubilosa esperança: “Escute a canção da vida”. Porque Vida é para ser sentida, sorvida, desafiada. Vida é incerteza e contradição, que, de mãos dadas com sua irmã leal, a Morte, nos traz concretamente a este mundo insano e dele nos tirará. Por isso somos títeres e maestros nesse concerto enigmático, onde o Mistério nos escreve; o Sofrimento nos dirige; o Ódio ensaia conosco e o Amor torce por nós...
2 – No cansativo e rotineiro cotidiano que
desfrutamos a duras penas, alguns com maior conforto, outros na zona de
conforto e inúmeros no campo do confronto, para muitos viver é um fardo, sempre
ou quase sempre. Então, onde buscar consolo para as perdas, se ele existir? Em
quem se amparar quando até mesmo as mais confiáveis buscas parecerem
insuficientes? Em que e em quem acreditar na tentativa de não ser mais um mero
suicida? Haverá algum sentido (e o que isso significa aqui?) para o que
chamamos viver em sociedade e interagir nela? O sociólogo polonês Zigmunt
Bauman, brilhante pensador contemporâneo, numa de suas dezenas de obras
resolveu batizar este nosso tempo de “modernidade líquida” – na qual nada se
solidifica; tudo é instável e passageiro, e flui e escorre pelo ralo e foge de
nós, vaporizando-se na atmosfera frágil de nossas bases conceituais,
sentimentais e comportamentais. Os assassinatos já não nos chocam. Não sabemos
quase sempre o que dizer e pensar ante o noticioso que cospe em nossa sala e
cara que um jovem facínora tramou a morte da família inteira, matando-se em
seguida. Esquecemo-nos de fazer a lição da consciência ecológica num mundo que
parece nos destruir aos poucos. Visitamos shoppings centers e nos endividamos
sem saber por quê. Corremos loucos por trabalho na esteira da academia para
ficar desejosos enquanto a mente se atrofia na primeira estação do desafeto.
Não enxergamos o outro como parte de nós e sim como ameaça. Acumulamos coisas,
e não saberes. É por isso que o maravilhoso poeta Ferreira Gullar insiste em
dizer que “a arte existe porque a vida não basta”. É para sentar conosco à mesa
ou dialogar em nosso colo que a arte se cria e recria energicamente. É para
mostrar que não somos capazes apenas do mal em todas as suas facetas, que algo
de luminoso em nós tateia o grito profundo de nossas misérias ou expectativas,
e faz a arte existir. E é no desenho desse contexto que a literatura se revela,
sob meu olhar, como um sustentáculo entre todas as manifestações artísticas:
ela tem a capacidade de nos redirecionar para dentro de nós mesmos como nenhuma
outra. O filósofo Heidegger afirmou que “a palavra é a morada do ser” – é lá
que podemos existir; é a consciência de sermos sujeitos de um discurso
entremeado em contato com o outro que nos faz gente; é na palavra que
constituímos o que pensamos e sentimentos, portanto, é nela e através dela, que
nos revelamos ao mundo e a nós. E que outra forma de expressão verbal e
linguística poderá realizar tudo isso com a máxima força criativa e subjetiva
que não a literatura? Onde mais pulsa a humanidade e toda a sua dança de
ternura e paixão a não ser nas performances textuais que somente o vigor da
expressão poético-ficcional pode permitir? Dessa forma, acredito no poder de
transformação operado através da leitura literária. Sei, e isso dói, que o
alcance desse poder não é tão grande quanto desejamos nós, mas ainda acredito.
Porque também me alimenta a ideia de que os tantos “fabianos”, com suas “vidas
secas”, em terras afora abrasadas pela injustiça universal poderão, se lhes permitido
e facilitado, refazer o trajeto de volta a si mesmos para reescreverem-se na
história das contradições de seu tempo. Eles, elas, todos, independentemente de
onde vieram, se com a arte estiverem, não estarão sozinhos. Não serão máquinas,
bichos ou fantasmas. Não se perderão no caminho. Serão mais humanos.
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