sábado, 21 de novembro de 2020

O QUE LAURA CARDOSO DISSE SOBRE A VIDA

"Viva la vida", de Frida Kahlo


Laura Cardoso disse: "A vida não se revela!" De fato, ela não se revela e representa um completo mistério. Talvez a única certeza que ela nos permite é percebê-la como algo passageiro. Sim, ela passa. Com momentos felizes ou tristezas completas, a vida passa. Creio, no entanto, que sabê-la passageira não é uma grande problemática da condição humana. O que nos massacra quando paramos para pensar nela é que sentimos a necessidade de torná-la significativa, peculiar, com algum sentido. 

"A vida não se revela!", disse nossa grande atriz Laura Cardoso. Como queremos tanto desvendar o que não se revela? Vida é coisa que não tem controle. Por que queremos tanto dar sentido àquilo que não podemos controlar? Parece loucura buscar sentido para algo tão impermanente. Sim, porque a impermanência, como mencionei antes, é a grande tônica da vida!

Sim, ela disse, Laura Cardoso, que: "A vida não se revela!" Vida é algo de tal modo atrelado ao tempo que, quando menos esperamos, eles se foram de mãos dadas pelas estradas pontiagudas que, invariavelmente, eles deixam para trás para nos punir o corpo. 

Concordo, Laura Cardoso: "A vida não se revela!" Parece que nós devemos passar a existência curta ou longa na tentativa de entendê-la ou de experimentá-la (quando nascemos com alma mais quente). Vida, tempo e medo são misturas que dão receita indigesta. Para revelar esse mistério é preciso ter coragem. Que tragédia nascer sem coragem! 

Laura Cardoso, tens 93 anos nesta data. Poucos poderiam dizer, com tanta propriedade, o que disseste: "A vida não se revela!" Não, não se revela e nisto pode estar a melhor parte. Sim, porque o incerto pode instigar, motivar, impelir... Curiosidade é vestimenta apertada que exige alento e alívio. 

Vou ficar pensando na vida, ou vou vivê-la, Laura Cardoso? Acredito no que disseste: "A vida não se revela!" Se o medo não me fosse tanto, se a solidão não me ferisse tanto, se o mundo não me amedrontasse tanto, se não houvesse tanto descompasso neste estar vivo... Quem sabe um dia eu não a compreenda melhor ou consiga vivê-la sem pensar tanto nela. 

Viver, sim, mas ciente de que, como diz Laura Cardoso: "A vida não se revela!"

Émerson Cardoso
21/11/2020

domingo, 1 de novembro de 2020

DIVAGAÇÕES-MELÓDICAS-DIVAGAÇÕES



Quando gosto muito de uma música ou canção me pergunto interiormente: será que após a morte eu a poderei ouvir? Também me pergunto se as pessoas que eu gosto já a ouviram - desejo compartilhá-la. Claro que minhas preferências musicais são bem controversas, porque amo de Luiz Gonzaga a Cyndi Lauper, de Bach a Reginaldo Rossi, de Tulipa Ruiz ao Abba, de Caetano Veloso ao Falamansa, de Amelinha a Demis Roussos, de Elza Soares a Mercedes Sosa, passando por Edith Piaf, Perla (a paraguaia, obviamente), Raul Seixas, Belchior, Gilberto Gil, Mozart, Elba Ramalho, Supertramp, Chopin, Os Mutantes, Françoise Hardy, Diana, Beethoven, Chico César, Daniela Mercury, Ednardo, e tantas outras vozes. 


Meu ecletismo, não se engane, tem suas restrições. A música não pode ser em volume alto para que eu a aprecie, porque tenho sensibilidade auditiva. A música não pode ter sons que me causem desconforto mental, como algumas de Kenny G. A música não pode ser mera repetição de sons por falta de criatividade dos envolvidos na composição (eles não devem estar mais preocupados em criar um produto a ser vendido em grande escala, como ocorreu com o forró estilizado e o sertanejo universitário, do que preocupados com a música em sua força e expressão). 

A música em si, com sua melodia e seus componentes, é uma das maiores dádivas que o ser humano pode vivenciar. Deus, a Natureza ou o Universo, um deles, deve ter pensado no quanto a vida humana poderia ser árdua e disse: "Que se faça a música para dar alento à alma dos seres humanos!" Para mim, é exatamente isso que a música representa: alento para a alma. 

Quando a música vem com letra temos a canção. Aí, Deus, entramos em outro momento engrandecedor dessa arte. Há compositores e letristas que produzem poesia pura e as harmonizam colocando-a em melodias maravilhosas. A beleza, então, se faz. É desse tipo de coisa que gosto: a palavra deslizando na melodia enquanto me diz sobre mim, sobre o outro, sobre a vida, sobre a morte, sobre o mundo...

Não sei nem como me expressar sobre isso, porque me comovo, mas estou certo de que a música, a letra de canção, as vozes que me acompanham desde a infancia são tão vivas quanto a própria ideia de existência. No meu caso, especificamente, coleciono músicas e canções em minha memória como se elas fossem fotografias que me trazem sempre alguma pessoa, cenário, lembrança, dor ou alegria. A minha vida sem música poderia ser um vazio indescritível. Então, por saber que ouvir músicas e canções é uma dádiva grandiosa, eu fico comovido e agradeço a Deus: obrigado por me permitir escutar sons que, combinados por alguns artistas, se transformam em pura arte, porque aqueles que eu escolhi para mim tornam a minha vida menos vazia e infeliz. 

Émerson Cardoso
10/10/2020 





NÃO OUSE ATIRAR A PRIMEIRA PEDRA

 


Eu cometi um erro. Você sabe que a vida humana é um histórico amplo de erros possíveis. O problema de errar se amplia quando uma falha tem implicação nos outros. O que se pode fazer, porém, quando algo acontece sem que você possa controlar? Tentar reverter o quadro. Você tentou fazer isso, não foi? Então, só resta esperar o tempo reorganizar as coisas. Se o tempo estiver ocupado e não organizar nada, que seja. O que se pode fazer? Cedo ou tarde tudo passa. Agora, depois de autocomiserações e punições autoimpostas, só há uma coisa a fazer: sobreviver a si mesmo apesar da tendência humana ao erro que traz em si.

Preciso ficar tranquilo. Sim, precisa. Aliás, devo dizer que você está perdoado. Quem nunca se viu numa situação de mal-estar por ter cometido erro? Durma tranquilo, porque no mundo só existe gente predisposta à falha. Pelo que sei, infalibilidade não é dom humano! Então, explore seu potencial de se refazer depois do caos! Sim, perdoo você por seus pensamentos, palavras, atos ou omissões. 

Eu aprendo com o erro. Você aprende, sim, e merece caloroso abraço. Quem achar que não, vá catar pedras no Hades - o Rio Estige está cheio delas! Tome meu abraço e lembre-se de que ainda vai errar muito na vida. Não se esqueça de aceitar sua humanidade redescoberta no erro! Quem acerta sempre é uma fraude!

Penso nas consequências. Sim, mas, que eu saiba, o mundo não deixou de girar por um erro cometido por você. Esquecimento é erro? No trancelim é, mas na vida pode não ser! Quem determina se é erro ou não, por vezes, é o contexto. Sei que o seu contexto não tem sido dos mais tranquilos. Por acaso existe alguém tão irreprochável que se sentirá no direito de julgar você por um erro que você cometeu e procurou consertar?  Não leve isso a sério: o sistema solar continua no mesmo lugar e, se houve alguma reconfiguração nele, não foi com o seu poder de erro. Pode retomar sua vida sem culpa ou medo, quem mais do que você merece que a vida seja pacificada? Você já teve que sobreviver a tantas intempéries! Esse caos vai passar - tem sido assim desde que o mundo é mundo.

Acho que tenho tendência a remoer demais os pensamentos. Jogue essa tendência no lixo! Sabe o que é pior na vida? Não errar. Gente perfeita é chata, sem graça, sem cor! Não digo que você a partir de agora vai se tornar um tresloucado inconsequente, não é por aí. O que quero dizer é: você não pode partir do pressuposto de que o mundo vai acabar ou a vida ficou insustentável por algo tão irrelevante que você fez de errado! Sei que não gosta, porém o momento é para palavrão: fala! Sim, um palavrão que coloque quem te julgar em situação constrangedora. Não vou insistir, mas se quiser dizer um palavrão o momento é: ontem-agora-sempre. Pode expurgar quando quiser!

Escutar isso me deu alento. Agora, siga certo de que não cometeu o maior dos erros. Você não fez nada que um ser humano em tempos de pandemia e em país tão mal administrado não faria. Acho que você ainda está no lucro por ter algum juízo. Eu sei do quanto você vive para o trabalho e para o estudo. Caso venha um desconforto por estar pensando na opinião dos outros, já disse que um palavrão resolve! No mais, meu neurótico favorito, você ainda tem uma tese para escrever e uma vida para tornar mais leve. Faça isso sem peso ou angústia. Não transforme sonho em pesadelo. Suas conquistas só vêm com suor e sangue, vai esquecer disso agora? Quanto à leveza, sim, busque-a com rigor. Afaste-se de gente que olha por baixo, que ri torto e que gosta de melindres. Feito isso, pronto! Siga: a vida precisa de gente capaz de olhar para si mesmo com riso na face e humanidade nos olhos.

 Com amor! 

Émerson Cardoso

20/10/2020