CARDOSO, Cícero Émerson do Nascimento. Uma breve explanação sobre Western. Revista Sétima de Cinema, n. 19, p. 10 - 13, out. de 2014.
Segundo
Vugman (2006)[1],
o Western é “considerado o gênero
cinematográfico norte-americano por excelência”. De fato, o cinema
norte-americano produziu para o mundo obras grandiosas deste gênero que alcançou
mais do que o mero status de produto mercadológico, tornou-se um mito.
“O grande roubo do trem” (1903), de Edwin Porter, é
considerado o pioneiro do Western e
já apresenta algumas características que seriam determinantes para o gênero. Diretores
como David W. Griffith, Thomas H. Ince, William S. Hart, John Ford, James
Cruze, Tom Mix, dentre outros, deram suas contribuições para a construção de
obras cinematográficas que foram, com a “evolução” do gênero, aperfeiçoadas tanto
na qualidade técnica, quanto nas constantes inovações de estilos e temas
empreendidas por estes.
Um dos temas recorrentes nas obras de Griffith e
Ince – a oposição simbólica do bem contra o mal representada sempre pela ligação
do herói com o sagrado e dos vilões com o profano – tornou-se uma das
principais características do Western.
Seguem-se a estas características: a reinvenção do Velho Oeste fundindo
diferentes épocas e regiões dos Estados Unidos em um mesmo espaço peculiar e
submetido a uma mítica atemporalidade, o realismo dos cenários, as movimentadas
cenas em que o herói – sempre com seu estimado cavalo – envolve-se em
perseguições ou enfrentamentos que exigem dele coragem e agilidade, a figura da
mulher pura e singela capaz de redimir o herói de uma vida de violência, o saloon como palco profícuo para os
vilões, as paisagens desérticas e áridas que reforçavam a austeridade da vida
das personagens, a recorrente indumentária – roupa com acessórios produzidos em
couro, esporas nos sapatos, chapéu e lenço no pescoço – que caracterizava o
herói, dentre outras.
Para além desta discussão inicial de cunho mais
teórico, considero pertinente dizer que o primeiro filme de Western que eu assisti foi “O homem que
matou o facínora” (1962), de John Ford. Este filme me causou forte impacto pela
qualidade do enredo, abordagem de certos temas e caracterização das
personagens.
Um dos muitos filmes em que John Ford fez parceria
com John Wayne, “O homem que matou o facínora” é uma adaptação de um conto
escrito por Dorothy M. Johnson e discorre sobre um senador que volta à cidade de
Shinbone, para o funeral de um velho amigo. O senador conversa com um
jornalista explicando-se sobre o porquê de estar naquele funeral e, a partir
disso, a história, como um fluxo, começa a ser relatada.
O senador trata-se de Ransom Stoddard (James
Stewart) – advogado idealista – e o morto trata-se de Tom Doniphon (John Wayne)
– um pistoleiro. Embora amigos, na juventude eles envolveram-se num conflito
amoroso porque ambos se apaixonaram pela mesma mulher: Hallie (Vera Miles).
Enquanto o triângulo amoroso se estabelecia, a
cidade sofria as ameaças do facínora Liberty Valance (Lee Marvin), vilão que só
temia Doniphon e que espancara e roubara Stoddart, a quem reencontrou e provocou
com veemência.
Quando Stoddard se vê de todo acossado por Liberty
Valance, este decide desafiar o vilão e propõe um duelo, embora não tivesse
habilidade no manejo de armas. Durante o duelo, Stoddard, que seria presa fácil
para o facínora, consegue sair vencedor. Acontece que ele ganhou a fama, porém
quem de fato havia assassinado Liberty Valance fora Doniphon.
Um filme de fluxos de consciência de uma personagem
inserida num enredo que se desenvolve entre flashbacks,
“O homem que matou o facínora” tende a exprimir com ironia e inteligência
aspectos políticos e sociais que surgem no irremediável. Stoddard revive, no
retorno à terra de sua juventude, lembranças por vezes amargas, embora
saudosistas e repletas de um sentimento de excessiva gratidão.
Uma das personagens que mais me chamam atenção, e
que protagoniza uma das imagens mais comoventes de companheirismo e amizade no
cinema, é a personagem Pompey (Woody Strode). Pompey, que durante toda a trama
mostra-se um amigo fiel de Doniphon, está ao lado do caixão, sem necessariamente
estar aprisionado pelos grilhões da mera subserviência, porque a ocasião já não
o incitava a isto, velando o amigo. Por algum motivo que ainda não sei
explicar, sempre que vejo menções a este filme, me vem à memória exatamente
esta personagem que, do meu ponto de vista, é uma das mais bem delineadas desta
obra.
Enfim, tanto se poderia dizer a respeito deste filme
dirigido por um dos maiores nomes do Western,
mas voltando a tratar do gênero Western,
o que parece pertinente dizer, para finalizar esta breve explanação, é que este
não parece ter arrefecido, pois, como se pode constatar, inúmeras produções
atuais recorrem aos elementos que ele apresentou ao mundo e vários dos seus
filmes, como “O homem que matou o facínora”, por exemplo, são mais que atuais e
merecem ser vistos e revistos por serem de uma qualidade técnica irrefutável e
por apresentarem personagens marcantes que compõem o imaginário que o Western construiu.
Afinal de contas, parafraseando a fala de uma das
personagens de “O homem que matou o facínora”: isto é o Western, senhores e senhoras, um mito, e que deve ser
publicado.
[1]
VUGMAN,
Fernando Simão. Western. In: MASCARELLLO, Fernando. História do cinema mundial.
7. ed. Campinas, SP: Papirus, 2006. (Coleção Campo Imagético).
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