Inicio
esta carta com uma pergunta filosófica: quando está em Juazeiro do Norte, o
senhor tem conseguido dormir em paz? Refiro-me não à sua administração que,
como temos visto, anda – como eu posso dizer? – muito bem... Quer dizer... Não
é uma coisa que se diga: ai que administração, mas...
Deixe-me
que eu explique a que eu me refiro... Eu perguntava se o senhor, caro prefeito,
dorme em paz sem ouvir um certo barulhinho no ouvido, ou certa picada na pele
que tem, na possibilidade de um tapa, por vezes aplicado contra si mesmo, a única arma
de que se dispõe para uma franca proteção?
Desculpe minha ignorância: é claro que o senhor dorme em paz, porque deve ter central de
ar em casa, ou ventilador potente, ou dinheiro muito para comprar Raquete mata-mosquitos, Baygon, Raid mata-mosquitos e repelente o tanto que quiser...
Quem
não dorme em paz é a população de Juazeiro, sobretudo a população mais carente,
que não pode comprar central de ar, ventilador potente ou Baygon, e outros produtos de proteção, com frequência! Aliás, até quem dispõe destes recursos não
tem dormido em paz, porque as vampiras aladas não se dão por vencidas...
Bolsas
de sangue, que poderiam ser doadas para o HEMOCE – instituição realizadora de
trabalho louvável e sério –, têm sido carregadas pelo ar no ventre disforme desses
esvoaçantes monstros noturnos a que a população denomina, com ódio veemente, “muriçoca”.
Será
um problema advindo da falta de saneamento básico da cidade? Será porque o
carro, apelidado popularmente como carro
do fumaceiro, não tem passado há milênios? Ou será mais um elemento convocado
para a perceptível tentativa de destruição da cidade? Sinceramente, não sei...
Minha
cidade tem sofrido muito com isso e eu, que também me vejo no clã dos que não
têm mais sangue a doar para quem toma de mim com violência, peço, amistosamente,
algum auxílio.
Não
sei o que tem causado a proliferação dessa praga – refiro-me às “muriçocas”, claro! – que
tem destruído a cidade. Elas vivem nas sombras e comprazem-se em roubar nosso
sangue como quem não tolera ver em nossas mãos o que nos pertence – lembra muito a postura de alguns políticos brasileiros...
Diante
disso, eu preciso externar, em nome dos moradores da cidade em que nasci, a
necessidade de que algo seja feito. Não é possível suportar essa situação como
se nada estivesse a ocorrer – o sangue representa vida! Que clichê! Pergunto, ainda, ao senhor: não temos mais o direito de deixar a vida circular dentro de
nós, com seu direito constitucional de ir e vir, pelas veias e artérias do
nosso corpo cansado de trabalhar para fazer algo pela cidade? Já que dormir não
nos é mais um direito, que ao menos nosso sangue seja preservado!
Considero
a presença desses seres devastadores um problema de saúde pública e, como tal, exige-se, das autoridades competentes, alguma providência. Caso seja inviável, para o
senhor, realizar saneamento básico em toda a cidade, com a urgência que o caso exige – que pretensão a minha! –, sugiro, ao menos, que entre em contato com o secretário de saúde do
município, com demais funcionários da área, ou com quem quer que seja, e veja
se não seria possível ressuscitar o carro do fumaceiro – talvez não resolva,
mas pelo menos assim ninguém dirá que o senhor não tentou reverter o quadro
sanguinolento em que nos encontramos...
Ou, se possível, dê-nos uma bolsa-muriçoca, ou seja, um kit entregue diariamente
no Centro Social Urbano – CSU – que contenha: Baygon, Raid
mata-mosquitos, Raquete, repelente e óculos escuros para escondermos as olheiras resultantes de noites mal dormidas. Com isto,
quem sabe, nós recuperemos nossa alegria de viver!
No
mais, caríssimo, que seu sangue seja resguardado! Que seu ouvido jamais seja fustigado
com zunidos devastadores! Que pela manhã seu rosto não seja marcado por
bolinhas vermelhas que denunciam 15 litros de sangue a menos – roubados de si,
corruptamente, numa única noite por essas bestas ferozes do armagedon, que nascem e renascem nos esgotos expostos da nossa cidade tão desassistida!
Creio
que o senhor tomará alguma providência... Tenho esperança de que virão melhores
dias para esta terra benemérita que não está a morrer à míngua, pois nela desfilam bons políticos – como o senhor, que, além de discursar muito bem, e ser
um grande articulador da língua portuguesa, é dotado de visão crítica, sóbria,
honesta e sensível aos valores que ela comporta, pelo que temos percebido!
Atenciosamente,
Émerson
Cardoso
15/08/15
15/08/15
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