terça-feira, 30 de agosto de 2022

NOTAS SOBRE O PROFESSOR GILMAR DE CARVALHO

Foto Divulgação

A primeira vez que vi o Professor Gilmar de Carvalho foi no Memorial Padre Cícero. Chamou minha atenção a capacidade dele de ser grandioso em suas palavras e, ao mesmo tempo, simples. Na ocasião, alguém comentou que ele era um dos maiores pesquisadores das tradições populares e eu constatei isso quando, ainda na graduação em Letras, li capítulos de Madeira Matriz – Cultura e Memória (1999) e o livro Patativa do Assaré (2000).

Depois, o reencontrei quando passei uma temporada em Fortaleza, entre junho e julho de 2010. Ele estava no Museu do Ceará. Foi a primeira vez que eu falei pessoalmente com ele. Foi a primeira vez que eu entrei no Museu do Ceará.  

Lembro-me de que ele estava um tanto apressado, mas meu primo o conhecia e apresentou-nos. Mesmo apressado, ele me deu atenção. Comentei que estava escrevendo uma espécie de Romanceiro que contava em poesia a História de Juazeiro do Norte, minha cidade, que decidi escrever após uma recomendação de Ariano Suassuna (a quem conheci e entrevistei em dezembro de 2009).

Ele me disse, na ocasião, que eu escrevesse esse Romanceiro, sim, e que poderia contar com ele para uma leitura e até para um prefácio. Fiquei irradiante, porque era uma deferência receber esse incentivo de uma personalidade que nós, estudantes e escritores do Cariri, já conhecíamos pela ampla pesquisa acadêmica realizada por ele em torno da Cultura Popular.  

Por timidez, não enviei o texto. Lamento até hoje por esse gesto de insegurança literária. Resolvi publicá-lo, para meu grande arrependimento, em 2014. Ele ainda estava incipiente. Se eu o tivesse enviado para apreciação do Professor Gilmar de Carvalho, ele talvez tivesse me dado as orientações necessárias para torná-lo um livro apresentável. Uma pena ter perdido essa oportunidade.

A terceira vez que nos encontramos foi no Passeio Público. Eu almoçava quando o vi chegar acompanhado de um amigo. Pensei em cumprimentá-lo, mas tive receio. Não queria incomodá-lo naquele horário de almoço. Se eu fosse falar com ele, meu gesto poderia ser interpretado como indiscrição. Lembro-me de que, na ocasião, olhei para ele várias vezes, mas não quis, por timidez, falar com ele. Quando eu saí, no entanto, fui até ele e o cumprimentei. Ele foi muito atencioso. Conversamos um pouco e fui embora. Nunca mais o vi pessoalmente.

Quem me apresentou o Professor Gilmar de Carvalho, em verdade, seja pelos textos que produziu, seja pelos depoimentos apresentados, foi João Pedro do Juazeiro. Este cordelista e xilógrafo, cuja obra fala por si em valor e criatividade, apresentou o melhor dessa figura emblemática que eu passei a admirar mais profundamente.

Para João Pedro do Juazeiro, o Professor Gilmar de Carvalho é mentor, padrinho artístico e mestre. Para ele, não seria possível pensar a arte que produz sem compreendê-la a partir da apreciação e incentivo oferecidos por esse grande entusiasta das artes do povo. Lendo os textos de João Pedro do Juazeiro (que escreveu sobre seu mestre cordéis, memórias, relatos de experiência etc.), eu acessei a alma desse pesquisador, jornalista, professor, escritor cuja alma transborda em riqueza de caráter e em generosidade.

Hoje, 30 de agosto de 2022, o Professor Gilmar de Carvalho faria aniversário. É triste pensar que ele, um baluarte da Cultura, da Educação e da Ciência desse país, foi embora. Temos por certo que, em sua ausência, permanecerá seu trabalho e seu exemplo. O Ceará, o Nordeste e o Brasil têm, nessa figura de relevo, um guardião da memória e, tenho por certo, a sua ausência física não o impedirá de fazer por nós o que ele sempre fez: abrir portas e acender luzes para quem a ele estende a mão.

Parabéns, Professor Gilmar de Carvalho!

 Émerson Cardoso

30. 08. 2022

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