PARTE
1
Primeiro
mês do ano de 2018. Entendo o porquê de as pessoas idealizarem tanto a festa de
fim de ano: o cotidiano é insuportável! Dormir, fazer refeições, trabalhar,
lidar com o trânsito, ser vítima dos impostos (IPVA, IPTU, dentre outros),
consumir no ar a pouca perspectiva de mudança para a política nacional...
As
mesmas pessoas que falavam do nascimento de Jesus, e desejavam ano novo
promissor a quem cruzasse o caminho, preferem dar bom exemplo aos políticos e
agem com altruísmo e respeito em filas, no trânsito, nas repartições públicas,
na cozinha de casa, nas calçadas do centro da cidade, nos terrenos baldios – com
que gentileza fustigam o mundo! A chuva de começo do ano mostra a gentileza do
povo sendo arrastada pelas ruas a entupir bueiros e esgotos. Ah! Ninguém
subestime o universo das sombras cotidianas: ele pode muito mais do que nós! E
Cristo fica em seu lugar de sempre, já não mais recém-nascido. Traz seus punhos
furados e seu lado direito sangrando – como de costume. Enquanto isto, o ódio e
a violência do mundo brincam de roda com a cristandade. Que ciranda festiva!
PARTE
2
A
chuva de começo do ano mostra a gentileza do povo sendo arrastada pelas ruas a
entupir bueiros e esgotos. Ah! Ninguém subestime o universo das sombras
cotidianas: ele pode muito mais do que nós! E Cristo fica em seu lugar de
sempre, já não mais recém-nascido. Traz seus punhos furados e seu lado direito
sangrando - como de costume. Enquanto isto, o ódio e a violência do mundo
brincam de roda com a cristandade. Que ciranda festiva!
O
primeiro mês do novo ano já fez deslizar máscaras. Pessoas abraçáveis colocam
punhais nos dentes e redesenham mágoas – comigo é diferente? Ética e respeito
não cantam notas expressivas. Se o planeta soubesse o que comporta cessaria seu
giro, e tudo o mais dançaria sem música. O ser humano pode ser podre, oco e
frágil, repetimos. E quem pode ser perfeição na Terra? E quem pode cerrar os
olhos? Poucos exemplares dignos ocupam os metros quadrados do planeta. E eu,
que não sei de mim? E eu, que pareço santo quando julgo o mundo? E eu, que
retalho a vida com mãos sempre feridas? Que vida? Ah! Não sei se 2018 poderá
trazer arcanos mais dignos. Ano eleitoral e de copa e de... De quantos outros
momentos de subterfúgio e caos?
PARTE
3
Acontece
que é fácil exigir dos outros uma solidariedade que não temos. Somos culpados
por esbravejar, ou por lavar as mãos? Cada verso do poema que não escrevemos é
a entrelinha do monstro morando em nós: ele está fadado a comer libertação e
iguais direitos para, insone, excretar não-fraternidades. Atirar pedra nos
outros quer ser nossa missão, percebamos! É possível vestir roupagem isenta de
orgulho e sombras, também tirar do olhar vapor de mágoas? Silêncio e solidão
seriam caminhos adequados, ou mesmo antídotos, que nos libertariam de errar
menos?
O
ser humano pode ser podre, oco e frágil, repetimos. E quem pode ser perfeição
na Terra? E quem pode cerrar os olhos? Poucos exemplares dignos ocupam os
metros quadrados do planeta. E eu, que não sei de mim? E eu, que pareço santo
quando julgo o mundo? E eu, que retalho a vida com mãos sempre feridas? Que
vida? Ah! Não sei se 2018 poderá trazer arcanos mais dignos. Ano eleitoral e de
copa e de... De quantos outros momentos de subterfúgio e caos?
PARTE
4
Primeiro
mês do ano, mas a sensação é de que os meses últimos já rechegaram. Seria
possível alterar o girar do mundo se eu corresse aos gritos pisando em pregos e
vestindo urtiga? Eu devo mudar primeiro, devo dizer. Mudar seria, meu Deus,
conviver sem vislumbrar tortura. Nem sempre o convívio é ferir os pés e
fustigar a pele – é certo. E, se a esperança se materializa, falhas são sinais
de redenção: erros conduzem, tanto quanto a morte, a humanidade ao mesmo clã
dos que vivem aos tombos. A cura existe? Ninguém se cura de errar aos prantos e
redesejar perdão. Ao ser humano, errar tentando o melhor convívio é vida acesa
no revirar das horas.
E
por falar em convivência, querem que eu me posicione ante dois espaços de ódio:
o ódio I quer que eu o abrace e odeie o ódio II, e o ódio II quer que eu o
abrace e odeie o ódio I. Não tenho condições, porque odiar estraga a pele e não
cura gordura no fígado. Se me dessem outra opção... Assim, prefiro o não e o
não. Preciso recuperar meus dedos, que se foram em aceno austero. O que fazer
com o que tenho agora? Ler é sufrágio, escrever é ponte. E tomar água e fazer
poemas riem de mim. Não apoiarei um ódio ou outro, porque amar é estrada de
espinho ridente que me instiga a recobrar meu pulso. E passar bem,
despropositados ódios. Espero que o que for amor, em cada rua, exista – e eu o
encontre na passarela inerte de um cotidiano bom.
PARTE
5
O
primeiro mês do ano está prestes a acabar – acabou, devo dizer. Ou será que no
espaço de um dia ainda poderemos viver grandes momentos? O ano, porém,
prossegue a marcha indiferente a chacinas, a tempestades políticas que têm se
formado, a olhares insones, a mudanças não planejadas e a golpes. O ano passa por estar com medo? Claro que não! O medo não o fustiga. O medo, antes, é vestimenta
que cabe melhor em nós. Tenho visto muita coragem assomar em gente antes medrosa.
Os tiranos e seus golpes não têm força quando a coragem redefine o sangue.
Então, ano que finda, pode seguir seu curso, mas nos ensine a ter coragem. Não
queremos congelar a boca e retesar os passos...
No
mais, quando o caos sair sedento pelas ruas da vida, e o país abrir seus
cansados olhos, será o momento da trégua? A esperança erguerá seu punho e
saciará, finalmente, a fome que nos acomete? Todos dirão, ano intangível, que a
voz guardada é bomba contra despotismo e morte. Na multidão escuto gritos de
medo – sou eu perdido procurando a mim. O fim se fez carne e habitou o mundo.
Adeus, janeiro! Aceite minha última saudação. Mas, antes, responda, Deus: virão
melhores dias?
Émerson
Cardoso
(Que
escreveu sem forças entre os dias 24 – 30/01/2018)
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