Um escritor inseguro quanto ao seu ofício depara-se
com uma cena: há uma velha sentada no alpendre de um casarão construído há anos
num sopé da Chapada do Araripe, floresta que corta, dentre outras cidades, Crato
– interior do estado do Ceará. A partir desta imagem, o escritor decide contar
uma história. Quem construiu o casarão? Por que o construiu sem janelas? Quem era aquela velha solitária cujo olhar comovente parecia perder-se em cenário
tão desolador? Na tentativa de desvendar o olhar anônimo dessa personagem, o
escritor passa a contar a história do casarão, construído sem janelas, e a história de seus
habitantes.
Para contar a história, o escritor dá
voz a algumas personagens para que elas mesmas apresentem suas versões dos
fatos. Com uma linguagem que tenta reproduzir as idiossincrasias linguísticas
da região em que as personagens estão inseridas, surgem os depoimentos de Augusta
(a ex-escrava cujo comportamento ambíguo movimenta consideravelmente a trama) e
das irmãs: Maria dos Anjos (dona do casarão e responsável por sua revitalização),
Angelita (que após um casamento conturbado foge do marido e vai buscar abrigo
no casarão da irmã) e Lina (a versão jovem da velhinha que no início do romance
aparece no alpendre e estimula o escritor a desvendar sua história).
Outras personagens ganham voz na enredística:
uma personagem muda (trata-se de Maria Tacita, cujas intervenções são indicadas
por meio de pontilhados), o Tempo (que ao narrar parece primar por intenso
lirismo), o Açude (que narra fatos vinculados especificamente à personagem Ana,
filha de Angelita), o Silêncio (que, em verdade, é o não-dito da personagem Maria
Tacita), o burro Sereno (que enfatiza a visita de Lina a Juazeiro do Norte, momento
em que surge o Padre Cícero – personagem histórica que comporta visões
ambivalentes a seu respeito) e, por fim, o Casarão (que, considerado maldito pela
circunvizinhança, apresenta uma versão elucidativa acerca de sua construção e das
pessoas que nele habitam).
O título da obra metaforiza a condição das
personagens femininas que vivem o enredo. A ausência de janelas no casarão
representa, nas camadas profundas do texto, a esterilidade a que a visão
patriarcal submete a mulher. Vítimas dos mais diversos conflitos existenciais, as
personagens desse romance formam uma confraria de sujeitos femininos que
tentam, até mesmo contra o tempo e suas devastações, transgredir às regras
estipuladas socialmente e sobreviver – mesmo quando a morte parece inevitável.
(Émerson Cardoso)
Nenhum comentário:
Postar um comentário